segunda-feira, 14 de maio de 2012

Comentários sobre o artigo "O futuro do Mercosul", do Emb Samuel Pinheiro Guimarães


As afirmações de nosso Alto Representante no Mercosul, no artigo "O Futuro do Mercosul", publicado na revista Austral. edição jan/jun de 2012, da UFRGS, distorcem fatos históricos de domínio público. Com a mesma ligeireza de pensamento, falseiam tanto os objetivos que nortearam a criação do Mercosul, como as razões que fundamentaram a abertura de mercado nos países da região no início da década dos 90. A abertura das economias não foi motivada por um desejo quase freudiano de "contribuição voluntária ao processo de globalização" , mas como uma fórmula para - entre outros objetivos concorrentes - abater a hiperinflação que corroía o poder de compra dos assalariados e desmontar mamutes estatais inoperantes, que funcionavam como grande cabides de emprego, sem vantagens para os contribuintes a que deveriam servir. Nos tempos da EMBRATEL, o telefone era tão caro e raro que constava da lista de bens na declaração anual de imposto de renda de alguns privilegiados. Hoje está universalizado ao ponto que o número de aparelhos é praticamente o mesmo que o de habitantes do país. Pode-se criticar a forma como essas privatizações ocorreram na região - em alguns casos apenas substituindo o monopólio estatal pelo privado - mas é inegável que suas economias se modernizaram e ampliaram as oportunidades de trabalho (o que não se confunde com emprego) em cada país.


Da mesma forma, o Mercosul nunca foi pensado como um aplainador de assimetrias, mas como um instrumento de inserção competitiva para essas economias no mercado internacional ( e é sob esse ângulo que deve ser avaliado). A conclusão seria que o Mercosul é uma área de livre comércio e uma união aduaneira tão imperfeitas quanto os acordos seletivos de livre comércio celebrados com os EUA e a União Europeia pelos países da região. O programa automotivo, apregoado como modelo no artigo, é um arranjo de controle de mercado das multinacionais do setor - e não um paradigma de cooperação econômica a ser imitado, pois opera contra os interesses dos consumidores. Além disso, o Brasil, se está disposto a ajudar o desenvolvimento da Bolívia, Equador, Suriname e Guiana, certamente dispõe dos meios para fazê-lo bilateralmente, sem os constrangimentos de uma camisa de força supranacional. Apenas seria de esperar que nossa "pujança econômica" (implícita no programa) pudesse pelo menos tentar antes realizar a tarefa internamente, via redução das desigualdades regionais no próprio Brasil.

Finalmente, embora seja inegável o êxito do modelo econômico chinês - calcado na exploração da mão-de-obra e na ausência de seguridade social (para não mencionar as restrições à liberdade política no país) - dificilmente poderia ser mimetizado no Brasil, na medida em que representaria um retrocesso nas conquistas sociais já alcançadas, estaria em contradição com o programa de todos os partidos políticos e ao arrepio das aspirações democráticas da população como um todo (que não estaria disposta a injetar maior estabilidade à nossa "trajetória econômica e política" através da adoção de "um sistema político colegiado e de ascensão gradual dos membros do Partido Comunista às posições de alta responsabilidade no Bureau Político do Comitê Central" - ou seu equivalente tupiniquim).



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